Quarto vazio

Apaguei as últimas palavras desconhecidas no livro. Assoprei as migalhas de borracha.

Escrevi poucas linhas e fechei o caderno vermelho.

Deixei o copo na porta. Havia menos, ainda era menos de um gole o que esperava no fundo. Minha cabeça acostumada a girar não girava. 

Entrei e fechei a porta. Apaguei a luz. Tirei a roupa. Fechei os olhos.

Abri os olhos.

Fechei os olhos e todo corpo era frio.  

As mãos paradas no ar. As unhas sem arranhar as pernas, os riscos e cortes, hematomas que não doem mais. A pele seca, a água parada numa garrafa velha. Um gargalo de onde não tomo.

…Os idiomas que não pronuncio na minha boca.

Deitei com o breu noturno de um quarto escuro.

Tudo era frio e uma música tocava no ouvido direito. O sol deitando atrás e todo o quarto ficando cheio de frio. Escuro… Cheio do pouco de mim…

Na borda do copo um pedaço da minha palavra. Na minha boca qualquer coisa em falta… O rosto quente e invisível. As voltas já feitas desfeitas na cabeça.

Era meu o rosto invisível, apagado nas palavras de um livro azul.

Eu apaguei todas as palavras riscadas nas semanas anteriores. Tirei a roupa sem notar que a escuridão me tocava sem fazer barulho. A escuridão de um quarto vazio e as palavras apagadas…

Era meu… Era meu o rosto que não existiu quando a escuridão sem voz tocou na palavra que foi escrita no meu corpo escuro de um quarto vazio…