SobreVida (dEles)

Palavras cruzadas, pernas cruzadas, mãos cruzadas. O chiado na chaleira, a neblina, o vento gelado. Um casaco, dois casacos, três casacos, cobrir a cara. Puxar o fio, empurrar a linha, desfazer do grão a casca. Arrastar os pés, despencar as portas e as tampas. Esquentar o chá, fazer café, polenta, acertar as contas. Olhar pela janela e deixar, talvez, isso que foi dado o nome de vida, passar, seguir adiante, continuar.

Desmanchar… E se for para falar desse desconhecido, o tempo, inventar. Não acho que a vida seja pouca. Mas deixa pra lá, às vezes é um reflexo, escapa na fração da abertura da luz, às vezes é a gargalhada que perdura sem quanto nem onde, às vezes expressão, esconde esconde. Reflexo da noite, lembrar dos pássaros, das flores, ligar. Passar. Ligar o carro, sentar na grama, caminhar. Procurar um causo, um fato, inventar. No gosto, a sopa, o doce, a pipoca, o bolo, lembrar…

Enquanto eu andava pelo país, pelas fronteiras, perto de onças, de mares e bares, em portos de gentes, em outros sotaques, enquanto provava frutas, calores, águas, enquanto eu brincava, dançava, voava, enquanto eu era janela a olhar. Enquanto eu ia, e vou, sem saber para onde... Esse susto de quem olha de longe.