Em algum lugar de algum lugar, corre perdendo o voo tentando não perder, ainda não sabe que o tempo, em passos lentos ou não, é tão somente o tempo, sendo sido de ser. Enquanto corre cruza com a personagem de um livro por escrever, mas não há tempo… Sua vida passa ali na vida que vai passando entre passageiros e copilotos que vão passados, entre malas e mochilas e gatos e cachorros que também vão passando e vai passando o tempo e o dia passando sem que ela perceba. Para a personagem o dia nem sempre tem a noite e às vezes a noite pode ser clara de dia. E os dias tão cheios do mantra não tenho tempo, em looping nas luzes e nos corredores de uma extensa área de embarque, onde muitos distraídos e atrasados e ansiosos e adiantados passam. Talvez, terá ela reparado nele, contra o atraso da saída da aeronave, carregando passos largos a expressão usada. Indiferente mas sutilmente demonstrando o tornozelo ainda dolorido, torcido na tigela escorregada das mãos pelo chão da cozinha esparramada no odor da manteiga dando entrada no convite à dança. Esquecidos foram os patins para gelo. No contra efeito de repente, ela notando notada, o trecho do primeiro parágrafo que se esqueceu enquanto escrevia a frase secundária. Só reparando mesmo, sem nada a perceber… Sobre o conceito do dia feito da soma das horas de sol com as horas sem sol, as horas anunciadas na frase decorada na pontuação da última chamada, noite… Não havendo um eu a escrever a descrição do impreciso, a consciência movente resvala e quase conclui a personagem, ilusionando a autonomia de suas mãos ao escrever (como ousa o narrador - observador de longe - defini-la, concluindo conhecer?) Na escrita da não escrita as nuances da porosidade sopram a escrita que se apaga num instante, a personagem existe para lá de quem dela passa. A personagem existe e a história não escrita sendo escrita ali mesmo onde não se escreve.... Enquanto ele ainda passa. Atrasado, apressado, a cabeça calculando o tempo. Calculando o tempo de uma vida feira das antigas antiguidades de saguão de uma única escolhida realidade. O segundo mantra o mundo é assim. E a personagem que não existe, ri. E ele continua sem ver, ele continua o fluxo do corredor. E os atrasados, os atrapalhados, os risonhos, os que olham para o lado, os que não sorriem como se não sorrir fosse uma competição para vencer. E ao silêncio alguém dança… sozinho no corredor, dança a pulsação do corpo sem contramão nem mão. Em algum lugar de algum lugar… A personagem que não existe, continua a rir… RJ - 21.10.25
