Teria sido honesto caminhar em silêncio, esquecida de mim em mim e de você - talvez - em você ou em outra vida qualquer. Seria honesto caminhar com silêncio sem dizer impropérios, sem vulgarizar ou maltratá-lo como se não fosse eu dele, sem preenchê-lo como perfumaria, porque os perfumes me enjoam e cheiro em mim é mato, flores ou galhos. Teria sido honesto não enganar a euforia pondo maquiagem na timidez…
Os olhos foram rápidos e eu, ao que parece, longe demais. Mas o reflexo foi honesto. E o que não foi era-me eu transposta com faixas de peles caídas, eufóricas, falantes, revelando o óbvio de um ou mil rótulos para ser… Nenhuma resposta rápida ou nas bordas será honesta. Foi desonesto apresentar como sou dizendo o que não se pode dizer.
Foi honesto querer conhecer e desonesto me investir como um teatro mal acabado.
Seria honesto dizer “olá” e deixar as voltas como estavam, nenhuma pergunta, nenhuma voz que não estivesse bebendo o próprio momento de, não pensando, ser bebido por cores de vento. E sendo bebido não possibilitar a escolha bipartida de mais um ano sem enlevos, novidades ou direção. A direção é singular.
Seria honesto dizer que o barulho que gosto é ranhura de lápis sobre o papel que não é branco e não é liso.
Seria honesto caminhar em silêncio, não inibir ou constranger as ruas, as paredes, os muros…
Se não tivesse me tropeçado, me atrapalhado, ou… Me esquecido. Mas de tão falado e tão falada e mal falada…
Mas veja bem, é honesto dizer - mesmo agora - que escrevo errado, que não tenho jeito e escrevo e nada além disso é o que sou. Não tenho sonhos e vivo por amor. Gosto de romance e vivo por amor. Eu não sei o que é o amor. Eu invento, invento versões para o que não sou. Estou sempre só. É bom estar... E estar com o silêncio. Nos últimos dias deitei mais vezes ao vento, talvez eu nunca seja fiel. Há um fui e um vou. E um voltar.
E vou...
E o reflexo é rápido. E eu vivo por amor.
E o pensamento, às vezes, tortura. Então escrevo, no escuro, sobre uma quarta-feira ou um dia qualquer onde me arrisco sem dar tempo de me impedir. Se pensava… Não pensava.
Mas eu me gasto e me desgosto. Tenho jeito para descobrir sentindo os jeitos e as feições que rondam movimentos. Quero não falar.
É desonesto quando é para falar…
É desonesto que tenha que falar.
É desonesto esse tempo que se atravessa e não se desfaz e se cobre com todo silêncio que amo e habito como se nada fosse além. O tempo me estaciona e eu induzo-o tagarelando, pondo a mão no queixo. É irreal a imagem do pó que já não escapa do ar.
Mas os olhos quando pisco são sinceros e quando me encanto com qualquer cisco particular incomunicável ao dizer… É sincero.
Quando escrevo existo. Nada fica por dizer. Nada há para ser dito.
É sincero o eu desconhecido.
E se o riso fosse visto só no riso e esta fosse a única curiosidade, talvez seria ainda e então a curiosidade não satisfeita, ainda dada às colheradas de um riso aberto, um pouco mais.
Não tenho certeza, mas acho que a saliva sonora e ruidosa está entre o que há de mais desonesto em mim.
É um saco onde enfio minha cabeça e me afogo, tagarelando.
Mas o som do riso imaginado outra vez depois… A imaginação é sincera.
Não falar sério e brincar com escolhas foram frações honestas do tempo. E a espontaneidade rida na escolha eu recebi como sincera, a migalha do tempo ali já bastaria.
Eu me interesso em não falar sério, não desdobrar filosofias, admitir que nada sei e que nada lembro e nada memorizo de datas, anos, línguas que não toco. Nada memorizo senão olhares disfarçados, primeiras vezes, paredes, cores, luzes, acasos, pombas bicando, taças, correr de nuvens, vento e asas, vento… É sempre o imperceptível que me ocorre, o fugaz, o simplório...
A brincadeira foi honesta, pena que a intenção era enganar silêncios.
Quarta-feira ou semana inteira?
Engatilhei-me sob faces que me empresto desinteressadamente. Mas elas não mudam esta muda insegura instável frágil de ser... A intenção de agradar me desagrada, a intenção de me agradar me desagrada. É desonesto...
Mais um gole desonesto.
E a curiosidade ainda é um pedaço desconhecido e sem sono para um passo arisco que puxou a barra do pano de riscar ou arriscar…
Os passos foram sinceros e o riso é este mesmo - dificilmente forçado. E as vezes é assim, não percebo qualquer coisa que vá além da meia voz de ser inteiro, eu para dentro. Os passos são sinceros, são sem fim, se aceleram sem notar, vão para… sem parar, sem lugar. Fazem-se caminhantes, só por caminhar.
O olhar no fundo é este mesmo, profundamente honesto. É vagarote, devagar…
Às vezes me seguro mesmo no cabelo, na alça. É falta de modo ou…
E o riso, sim. É de verdade. O riso foi sincero. Risonhamente honesto.
Do tanto eu desonesto, foi honesto o riso e ver passar…
E o que escrevo no escuro, de pensamento desprovido, com o tempo deitado no limite e as margens no possível - ao qual não sou honesta porque não o acredito… O que escrevo no escuro, o que sou no silêncio escuro, talvez isso… Talvez seja honesto.
08.09.2020
09.09.2020
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14.09.2020